“Não acho que o jornalismo morreu, acho que ele se reinventa” Lis Aline Silveira, editora do Diário Gaúcho

Foto: Amanda Krohn / faculdade São Francisco de Assis

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Lis Aline da Silveira tem 41 anos e trabalha como editora no jornal Diário Gaúcho. Está na empresa há 17 anos, mas nem sempre foi editora. Nascida em Canoas e formada em jornalismo pela Unisinos, a atual gestora cedeu uma entrevista em um domingo de setembro. Falou sobre sua experiência como repórter e expressou sua opinião sobre a influência da internet no futuro do jornalismo, e também sobre o Fake News.

Confira a entrevista:

Amanda: O que fez você se interessar por jornalismo? 
Lis: “Eu gostava de ler, gostava de escrever, ia bem na escola, gostava de notícias, queria saber de tudo, gostava de conversar... aí as coisas foram se encaminhando pra esse lado”
Amanda: Por quanto tempo você foi repórter?
Lis: “De 2010 a 2013, eu sou uma das fundadoras do Diário Gaúcho, no sentido de integrar a primeira equipe que foi contratada.”
Amanda: Como é a sensação de participar dos primeiros anos de um jornal, acompanhar o que mudou de lá para cá e ver o quanto ele evoluiu?
Lis: “É bem interessante acompanhar as mudanças, é bem legal. Bastante coisa mudou, porque quando a gente começou era uma equipe toda pra fazer um jornal, e agora a gente trabalha mais com a rotina de integrações. A gente produz conteúdo pra Zero Hora, a gente usa o conteúdo da Zero Hora, da Gaúcha, da TV... tá tudo junto e misturado. Era todo mundo produzindo conteúdo só pro Diário Gaúcho, agora a gente já mudou, a gente já adapta os conteúdos de todo mundo. A gente não trabalha mais sozinho, agora a redação é junto com a Zero Hora, eles trabalham no mesmo lugar que nós”.
Amanda: Como é a rotina de trabalho em uma redação?
Lis: “A redação não obedece uma dinâmica de trabalho como uma firma, por exemplo. Sempre vai ter alguém chegando ou saindo, os horários têm uma flexibilidade. Dependendo do teu trabalho, tu pode chegar um dia às 8h, um dia às 9h, um dia às 11h e um dia às 14h. Na minha empresa a gente trabalha de segunda a sexta, um domingo sim e um não, um feriado sim e um não.”

Foto: Amanda / faculdade São Francisco de Assis

Amanda: O que você está achando sobre a função de gestão?
Lis:“É complicado, não é tão legal quanto ser repórter.”
Amanda: Você gosta mais de ir na rua, entrevistar e produzir conteúdo?
Lis: “Eu preferia, mas é uma evolução natural. Quando tu é repórter, você só pensa no teu, nas tuas matérias. Quando tu vira editora, tu tem que pensar se o jornal tem manchete ou não, se tu vai ter espaço pra tudo o que tu quer adaptar, são outras preocupações. Gerenciar as pessoas também é bem chato, os funcionários ficam brigando porque querem ter férias no mesmo mês, aí tem que ficar cuidando...”
Amanda: Você se sente muito pressionada pra ter um conteúdo perfeito, já que tu é responsável por corrigir e mandar em tudo“Totalmente, é uma pressão que tem pessoas que não aguentam, não é pra qualquer um.”
Amanda: Como você faz pra lidar com esse estresse?
Lis: “Tem que ir vivendo um dia de cada vez, mas a pressão é total. Tem muita gente que não tem competência pra trabalhar em redação, poucos aguentam tantos anos.”
Amanda: Você acredita que para ser repórter ou assessora a pessoa deve manter as redes sociais o mais fechadas possível, no sentido de evitar o compartilhamento de momentos pessoais, como festas e etc?
Lis: “É que as duas coisas acabam se misturando, o seu privado e o seu público. Tu tem que dar uma filtrada, entender o que tu quer, qual recado tu quer passar. Mas isso não quer dizer que tu não precisa opinar sobre nada. Quando tu vai procurar um emprego é certo que vão vasculhar a tua rede, mas não que isso vá te comprometer, porque tem muita gente que trabalha aqui que põe no face foto de balada. “
Amanda: Há quem diga que repórteres e jornalistas em geral não devem expor suas opiniões nas redes sociais. O que você tem a dizer sobre isso?
Lis: “ É muito complicado. Por exemplo, na RBS tu recebe várias orientações de como usar as tuas redes sociais. Eu trabalho em uma empresa para a qual a opinião é muito importante, então é preciso ter um certo limite para se manifestar. Na semana passada, um colega nosso se manifestou de uma forma meio exagerada sobre a questão do Queemuseu, e usaram o post pessoal dele pra dizer que era opinião da Zero Hora e o MBL liderou um boicote à Zero Hora baseado em uma opinião pessoal que ele deu sobre o assunto.
Amanda: Será que existe um meio de opinar sem causar uma grande polêmica, talvez escolhendo melhor as palavras?
Lis: “O posicionamento é uma linha muito tênue. Eu, particularmente, acabo não me envolvendo  em assuntos polêmicos na internet justamente pra evitar incomodação pro meu lado. Acabo preferindo expor as minhas opiniões apenas em rodas de amigos e usando menos as minhas redes sociais pra esse tipo de debate”
Amanda: Quando um repórter possui um posicionamento forte em determinados assuntos, você acha que tem muita chance de esse posicionamento se misturar com a notícia que ele irá produzir, mesmo que de forma inconsciente?
Lis: “Quando tu faz um texto jornalístico, tu não traz a tua opinião. Às vezes é difícil, mas tu tem que ouvir os dois lados. Vamos supor que tu vai cobrir uma reintegração de residências em uma área onde vivem muitos pobres: vai estar havendo muitas famílias que vão ficar sem casa. Tu pode ter uma tendência a colocar eles como uns coitadinhos, mas por outro lado, a justiça que ordenou. É a justiça que determina tudo, sinal que pode ser prejudicial, que aquele lugar tem dono. Tu também não pode fazer o texto dizendo que eles são uns coitadinhos e que o dono do lugar é uma peste, então tu tem que sempre manter a tua imparcialidade. Isso também tem muito a ver com o veículo no qual você trabalha, por exemplo, uma coisa é tu trabalhar na RBS e outra é tu trabalhar na Mídia Ninja, no Sul21, que são lugares onde o posicionamento é mais de esquerda e tu tem que adotar o posicionamento da empresa onde tu tá trabalhando. A empresa vai te dizer o que pode e o que não pode e como ela atua em determinadas ocasiões”.
Foto: Amanda Krohn / faculdade São Francisco de Assis

Amanda: Por causa da internet, muitos dizem que o jornalismo morreu. Qual a sua opinião sobre isso?
Lis: “O jornalismo, eu não digo que ele morreu, eu digo que ele passa por uma reformulação constante. Talvez, eu que trabalho há 17 anos no jornal impresso, talvez daqui a pouco a minha função não seja mais em jornais, mas não acho que o jornalismo morreu. Acho que ele se reinventa, vai pra outras mídias, pra outros tipos de coisa, mas não que ele acabe”.
Amanda: Tu acha que a internet atrapalha muito o jornalismo, em função das notícias falsas?
Lis: “Sim, acho que 100% das notícias falsas são da internet e existem pessoas realmente mal-intencionadas. Eu já li reportagens sobre isso, tem pessoas que criaram sites só pra difundir notícia falsa, porque elas vivem do clique que elas adquirem.  E as pessoas fazem isso sem o menor pudor, não é só no Brasil, é no mundo todo: a eleição do Trump teve muita notícia falsa. A internet é uma coisa maravilhosa, mas é também através dela que a gente conhece o que tem de pior na humanidade”.
Amanda: Qual é o papel da imprensa no combate às chamadas Fake News?
Lis: “ Hoje em dia tem muita notícia falsa, e tem muita gente que só porque viu no face ou não sei onde já acha que é verdade. O papel da imprensa na atualidade é tentar separar o que é notícia falsa e o que é notícia verdadeira. Ter alguma credibilidade”




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